domingo, 31 de maio de 2009

Do ECO!

O ECO - performances poéticas completa, nesse mês, 1 ano de idade. E lá fomos nós entrevistar os fundadores do evento.

(obs: foi mantida a informalidade oral.)

*

Pamella: Como surgiu o ECO?

Anderson: Surgiu meio ao acaso, na verdade. Eu tinha recebido um convite pra fechar o Café Filosófico. E o Pedro e a Maria Helena, que estavam organizando, sugeriram fazer uma abordagem da literatura, escolher um tema da literatura que fosse de fácil entendimento. Aí eu convidei o Capilé e a Juliana. Eu e o Capilé só nos conhecíamos por e-mail, então eu pensei em aproveitar. Cada um lia um poema e eu fazia um comentário crítico. Nós levamos uns envelopes e deixamos com todo mundo que estava lá, dentro de cada envelope tinha um poema, e depois, quando terminou, a gente fez um convite para as pessoas lerem os poemas que estavam lá. O Marcos Marinho ficou empolgado e falou com a gente, se a gente não queria pensar em fazer um sarau. Foi quando a ideia do ECO começou a brotar. Isso foi no final de 2007.

Capilé: A gente começou a se encontrar regularmente e criar uma relação de amizade. A princípio, era uma relação de paz: a gente produzia, escrevia, mas não tinha um canal de comunicação efetivo. Como o Marcos Marinho propôs a ideia do sarau, a gente começou a conversar sobre as possibilidades de realização disso. O primeiro aconteceu dia 6 de junho de 2008. Uma coincidência monstruosa, porque a gente escolheu o nome e o ECO acabou estreando no dia da ecologia. Uma coincidência feliz. A gente não sabia muito como fazer. Qual é a ideia original de um sarau? É a mais completa chatice. Quando fala sarau, contemporaneamente, as pessoas já pensam assim: é alguém que vai sentar, colocar uma meia-luz e ficar lendo interminavelmente de uma maneira tediosa. A carga semântica dessa palavra 'sarau' remete a algo antiquado. E a gente começou a pensar em como romper com isso. Esse processo, da fala do Anderson no Café Filosófico até a estreia em junho, foi todo pensando em como realizar o evento.

Anderson: A gente queria que fosse uma coisa, ao mesmo tempo, um exemplo literário, mas que não tivesse o formalismo excessivo. Tanto que a gente não usou a palavra sarau. Então a gente começou a pensar na dinâmica do evento... surgiu a ideia do MC, que seria alguém pra apresentar as pessoas mas manter também o entretenimento. Tem a liberdade dada a quem vai apresentar, também. A gente dá o tempo, 10 ou 15 minutos, e a pessoa pode apresentar do modo que ela quiser. Acabou que todo mundo fez a leitura normal, mesmo. Mas a gente pensou nessa liberdade, já esperando de alguém fazer alguma loucura. Nesse primeiro ECO a gente foi sem saber o que ia fazer, não estava estruturado ainda. O Pedro Paiva ainda estava assistindo. E a gente tava preocupado como seria a dinâmica. A gente pensou em convidar um ator pra ser MC, mas o Capilé acabou apresentando. E criou uma identidade a partir dali. A gente convidou também um cara pra tocar guitarra e um pra percussão, que chegou no final do evento. E tem o microfone aberto, que já estava projetado, pra que o cara não fique só assistindo. Essa separação, esse distanciamento entre público, apresentador e o cara que está lendo o poema, era justamente com isso que a gente queria acabar. Nossa ideia, na verdade, era juntar as gerações. No meu caso em particular, me incomodava muito isso. Tinha saído um livro do qual eu participei, o "Poema de Sete Faces", e logo quando saiu, todo mundo falava comigo: você tem noção que você faz parte de uma nova geração de poesia aqui em Juiz de Fora? Tem a geração do Gilvan, a do Fiorese, a do Edimilson, etc. E eu me sentia um velho com isso. Não tinha feito nada ainda pra isso. E essa separação dá a impressão de que essas pessoas vivem em mundos completamente diferentes. E a ideia do Eco, da ecologia, era poder juntar todo mundo no mesmo palco, fazer uma interação de gerações, poder dissolver a ideia de geração e substituir isso por um corpo único. E isso funcionou bem, porque o público teve uma receptividade boa. Numa edição o cara lia no microfone aberto e na outra ele já ia pro palco principal.

Capilé: Na escolha do primeiro elenco de convidados, já tinha essa identidade plural e gregária que era o evento, sem diacronia. A gente nunca pensou em constituir um grupo. Então, no primeiro evento tinha: Fernando Fábio Fiorese Furtado, que tem uma representatividade na cidade, com o D'Lira, o Abre-Alas e toda uma produção; André Monteiro e Anderson Pires, que fizeram parte de um recorte de produção e pensamento na universidade e fora dela e que está deslocado, a princípio, dessa produção anterior ao Fernando; e Carolina Barreto e eu, que estávamos produzindo efetivamente hoje. E com essa pluralidade de vozes, a gente diluiu o circuito geracional. O evento ficou maior do que a gente imaginava justamente por isso.

Anderson: Uma coisa que eu acho legal é como o Pedro se inseriu no evento. No primeiro, ele estava lá, só assistindo. No segundo, ele entrou com a ideia das pick-ups, pra fazer uma trilha sonora entre as pessoas que iam ler e o apresentador, e que virou uma parte essencial do evento. Muitas coisas do ECO foram construídas intuitivamente, a gente via se dava certo ou não, sem pensar muito. E aí começou uma das coisas mais engraçadas: as reuniões antes do ECO pra decidir como vai ser a apresentação, a ordem, as músicas. E as músicas começaram a fazer parte da dinâmica. Como essa volta agora, com o vídeo do Chicão. Uma coisa que a gente queria desde o ano passado era mudar aos poucos o formato da apresentação pra não ficar repetitivo. Então a gente vai agregando as pessoas que vão chegando com ideias que dão oxigênio pro ECO, porque a gente depende muito do participante, o clima do evento vai de quem vai ler. A reação do público é bem legal. A gente observa enquanto o cara tá lendo e vai ditando também o clima, sugerindo uma música.

Capilé: No segundo evento a gente dialogou com uma antologia que saiu em Portugal, chama "Oiro de Minas", que reunia um recorte da produção contemporânea em Minas Gerais e, dos 10 poetas elencados, 4 ou 5 eram daqui de Juiz de Fora. Como estavam todos aqui, pensamos em fazer o evento com essas pessoas. Como a gente conhecia essas pessoas, a gente foi criando trilhas a partir de cada individualidade. Mas isso só funcionou pra gente.

Anderson: Tem outra coisa. Quando a gente começou a discutir, a gente pensou em quem seria o público. E concluímos que não adiantava pensar nisso, porque não ia dar pra controlar. Na verdade, o ECO tem um público muito móvel, quem lê leva seu público. Não dá pra marcar um perfil do. Esse ano, o público tá muito mais rejuvenescido.

Capilé: Não que o público anterior fosse exatamente velho. E se fosse, não que isso se constituísse em um problema. Há velhinhos que são boas pessoas.

Anderson: No início, o público era muito mais acadêmico e muito vinculado a algumas coisas que ocorreram ano passado. O ECO ganhou algum respaldo com a campanha da Margarida, a gente se envolveu nessa agitação. Esse ano tem muita gente que nem está ligada à academia. E tem muita gente que vai também pra curtir a noite, encontrar as pessoas. Tanto que a gente pode destacar: o público que vai pra curtir a poesia chega às 20:30; o público que vai pra curtir a movimentação, chega a partir das 21:30, 22:00. Essa galera que chega depois, ou vai direto pro microfone aberto ou só pra estar nesse ambiente festivo. E as pessoas vão porque ouviram falar, porque viram no jornal... a gente fica até surpreso, porque a gente começa a pensar na divulgação do ECO 2 ou 3 dias antes. E quando a gente chega lá, não tem quase ninguém... de repente enche. A gente conseguiu criar algo que eu acho que não é nem mérito nosso, é mais pela carência de algo do tipo, as pessoas estavam esperando por isso. Acho que daria certo independentemente de quem fizesse. A literatura, aqui, é muito presa à federal, ao CES, e a gente conseguiu desvincular um pouco disso.

Larissa: Como ocorre a seleção do elenco principal?

Capilé: São três processos. Em certo sentido, tem um mapeamento da produção local, das pessoas que já foram publicadas. O ECO é um espaço de autoralidade, todas as pessoas que vão são autoras. Pra ser convidado pro ECO, tem que ser autor. E a gente mapeia isso na produção impressa local. Outra forma: os autores publicados em vias independentes de produção. Blogs, fanzines, por aí vai. E outra: o microfone aberto. Lá a gente encontrou figuras que já fazem parte da história do ECO. Exemplo: Gustavo Matos, ou Maozão. Ele foi lá, leu o poema dos dadinhos, causou um furor, a gente foi se paquerando... e aí convidamos ele pro quarto evento. Na primeira vez que o ECO saiu do seu espaço natural, que é o Mezcla, foi quando a gente organizou um sarau no comitê da Margarida. Ali a gente viu o Tiago Rattes em ação, foi convidado, leu no microfone aberto, depois foi pro principal e hoje já é da organização. A Patrícia Almeida apareceu no microfone aberto. A gente tem essas vias. O que é importante é: esse é um espaço para autores que não previam uma recepção. A gente tá criando um espaço pra recepção desses autores, uma vez que há a dificuldade de divulgação etc. Porque o blog, apesar das capilarizações que ele possibilita de criar, ele tem uma limitação. A princípio, não é todo mundo que tem acesso.

Anderson: A rigor, quando a gente começou, a gente tava pensando nisso. A ideia do microfone aberto era que as pessoas, quando fossem ler, já levassem um público. A gente considerava que o cara, por ter um livro publicado, teria seus leitores. E a gente descobriu que não é assim. Um dos saraus que a gente achou que ia ficar mais cheio, foi justamente um dos que ficaram mais vazios, que foi o do lançamento do "Oiro de Minas". O pessoal do livro tem um público, mas que não é propriamente do espetáculo. O reconhecimento da produção dos autores desse livro não foi revertido em público imediato no evento. Em contrapartida, o terceiro evento, que tinha mais autores locais, foi um dos que mais ficaram cheios. Tinha a Laura, o Arnaldo, o Rogério Batalha, o Alexandre e o Oswaldo Martins. E foi também a partir desse terceiro que a gente começou a improvisar mais. A gente foi criando um ambiente mais descontraído. Mas às vezes isso pode ser ruim, ser descontraído demais pode prejudicar.

Capilé: Porque existe um princípio: divulgar a produção das pessoas. Existe a ideia do encontro das pessoas, também, mas tem esse princípio. Uma coisa que a gente temia era a relação do público com o poeta. Por ser um bar, a gente ficava preocupado das pessoas conversarem muito, mas não, existe um respeito muito grande. Talvez isso venha do próprio lugar, talvez o Mezcla produza isso, esse público respeitoso. Existe uma cartilha de comportamento nos espetáculos. E o ECO não tem isso, as pessoas não têm nem ideia de como se comportar.

Pamella: Porque é uma coisa como no teatro, né? Que, por exemplo, quando muda a cena você não aplaude no meio. Talvez o público pense assim.

Anderson: É, isso aí. Não tinha pensado nisso. Até por conta de ser no Mezcla talvez tenha isso, né? Uma educação do público que vai no Mezcla. Porque o lugar também impõe a tua conduta.

Capilé: É complicado porque a gente tem uma rotina assim: Quais são as rotinas de espetáculo, de uma maneira geral? Um concerto de música. Cada tipo de show de música indica um comportamento. Mas, no geral, acaba uma música as pessoas aplaudem, acaba outra música as pessoas aplaudem, né? Você vai no teatro tem um outro tipo de comportamento. No ECO não tem essa divisão de comportamento. Primeiro, as pessoas nem sabe o que elas vão lá ver de verdade. Então elas não têm ideia de como se comportar aí fica um místico de comportamento porque tem poeta que lê e já "pum", já indica assim "me aplaudam", aí acaba de ler outro e ele "me aplaudam novamente"
Anderson: Tem aquele camarada também que ele lê um texto que cai, que todo mundo gosta aí tem uma reação mesmo, é tipo uma reação natural. Dá pra sacar quando determinado poema, por exemplo, bateu no gosto da galera. Com o Thiago Rattes rolou assim. Com o Mãozão rolou assim quando ele leu no microfone aberto.

Capilé: Ele subiu lá, leu o "Poema dos Dadinhos", terminou e o pessoal estava alvoroçado. Eu nem sei se isso funciona no papel, não. O negócio é a figura do Gustavo lendo. Porque tem isso também, são características que o evento traz, do modo de leitura de cada um. O lance da "performance" vem daí. Porque tem uma poeta, que grande parte das pessoas até gosta bastante dela, que é ela lendo, que é a tal da Patrícia Almeida. A Patrícia Almeida lendo os seus poemas é completamente inverso de ler seus poemas. Ela lendo, é indiscutível que ela tem todo um aparato e domínio de cena que torna os poemas, na minha perspectiva, maiores do que realmente são.

Anderson: Porque tem poemas que são, realmente, feitos para serem lidos no papel e tem outros que, talvez, não adianta você ler que... Não é?

Pamella: É, isso acontece. Às vezes, uma pessoa fala "tal poema é demais" e você lê e não acha.

Anderson: Eu acho que tem manha, eu percebo que, os caras que se dão melhor, assim, numa relação com o público, que têm uma empatia imediata com o público são caras que escrevem de um modo mais simples. Que têm uma simplicidade vocabular, eles têm um contato maior do que poetas que têm um trabalho maior com a palavra, que não é só a questão do ritmo, mas têm também a escolha da palavra, que têm mais construção, têm mais neologismos, têm uma dificuldade maior. O público demora a perceber porque como o cara se concentra muito no trabalho só da palavra, acaba que, quem está ouvindo está esperando uma "historinha", está esperando um tipo de emoção mais à flor da pele que não aparece, vamos dizer assim, como aparece uma coisa muito intelectualizada o pessoal demora a perceber, demora a sacar, tem só uma reação no final.

Capilé: Um exemplo disso, no terceiro evento, foi o Rogério Batalha. Os textos do Rogério Batalha ele têm, embora haja um trabalho com a linguagem, digamos assim, apurado, ele não é um poeta ingênuo. Quando ele leu um poema de um livro que chama "Sagacidade é saber farejar delícias" e leu o texto em si mesmo, quer dizer, "uw". Foi uma característica. Por exemplo, a minha característica de poema, é um texto pra ser lido, não é um poema pra ser falado, mas eu criei uma maneira de ler meus textos...

Anderson: Uma maneira que só ele sabe.

Capilé: Não interessa nem, em verdade, o que está sendo falado mas o modo como aquilo ali é expresso. Eu fiz uma escolha por uma leitura, assim. Eu li, praticamente, um texto, no formato de prosa, numa corrência e tal fato virou um módulo sonoro. O impacto era só para o final mesmo. Não era nem o que estava sendo lido. O Anderson tem um modo da palavra que é falada e vai te pegar. E vai te pegar porque você aceita o poema. Não estou falando que simplicidade é a força-linguagem, não, estou falando de aceitação com o poema falado. Existe um diálogo, ele cria esse diálogo. Alguns pedem diálogo, outros pedem repulsão. Repulsão como uma ética da poesia, de poéticas particulares. Tem poetas que passaram por ali que "falaram" e outros que atingiram, que criaram uma estocada, posso citar: o Anderson, André Monteiro, Thiago Rattes, Gustavo Mattos, Rogério Batalha, Ronald Augusto. A leitura do Ronald Augusto também foi poderosa e até estranha.

Anderson: Ele tinha vindo aqui um dia antes na universidade, em um encontro de Literaturas Africanas. E ele tem muito poema visual, ele ficou explicando os poemas e eu falei com o André depois "Cara, eu estou preocupado porque se esse cara for lá no ECO e ficar explicando os poemas vai ser uma chatice". E ele adorou, ele curtiu, foi o último a sair de lá, porque ele não fez isso, foi impactante.

Capilé: Ele foi pra ler e leu e foi ...Vigor. Foi muito... Pulsante, talvez pulsante seria a melhor palavra. Alguns autores criaram essa cara de leitura, outros autores já seguiram uma modalidade de leitura, não vou dizer tradicional, mas com uma outra de corpo, inclusive, para ler seus textos. A Laura Assis atinge uma galera com o modo de escrita dela e o modo como ela lê, que é um modo, aparentemente, tradicional mas o texto dela é um texto que gera uma empatia quase que imediata. O Arnaldo falou assim "Eu vou ler poemas de amor" e modo dele de apresentar o poema, "pum", já ganha porque você modaliza o público.

Anderson: E, tem outra coisa também, os poemas de base amorosa são...

Pamella: Os preferidos, né?

Capilé: O Arnaldo teve uma presença interessante, tem um outro poeta que pode entrar nessa categoria... Agora me fugiu o nome. Era uma senhora que leu junto com o Ronald Augusto, que era duma simplicidade, assim, avassaladora. Finge - simples, como nosso querido amigo Manuel Bandeira. Carolina Barreto também, à sua maneira e tal. Há poetas, que não cabe falar quais foram, até por uma questão de escolhas mesmo que, praticamente, assim, poetas que passaram pelo palco, pura e simplesmente, poetas que criam defeitos de leitura, que legendavam os poetas "nesse poema eu vou falar disso, disso e disso" e lia o poema. Quer dizer, legendas o poema prejudica completamente a leitura do poema. Na verdade não é querer gerar esse tipo de valor porque as escolhas são muito particulares, são da recepção mesmo. A Patrícia Almeida entra nessa categoria, mas ela tem uma performance no palco, ela tem um modo de operação que é só dela, é um valor que é dela e ninguém pode tirar isso dela. Mas, é um evento plural.

Anderson: É, acho que essa é a palavra na verdade.

Capilé: É plural.

Larissa: A Laura, ela é do nosso blog, né? E ela falou que não pôde vir porque está sendo escravizada pelo simpósio, e ela pediu, exatamente, para vocês elencarem os momentos antológicos do ECO.

Capilé: Isso é bem particular, eu tenho alguns momentos. Os momentos que, particularmente, foram "porrados": o incêndio do Anderson, que foi assim, realmente, inesperado. A leitura do André foi muito interessante por conta de como ele conduziu a leitura. A leitura do Rogério Batalha foi poderosa, foi curta e um golpe certeiro, porque tem isso também. O Ronald Augusto também está entre minhas preferências grandes e... assim, eu, particularmente, gostei de "me" ler, é meio esquisito isso, mas por conta do que o evento já tinha se tornado pra mim e eu escolhi um modo de leitura, eu pensei um modo de leitura. Eu tenho um corpo de texto que chama "Casal de uns" e no final dele tem um texto em prosa, na verdade o livro é todo recortado de prosa, mas no final tem um texto chamado "Carta aberta para leitura íntima" e junto com essa Carta Aberta eu acabei colocando outros textos junto, então li Drummond, li Gilvan, li Anderson, li André, junto com o meu próprio texto, li Walter Benjamin, li texto teórico dentro da poesia, com recortes. Foi uma leitura que durou, realmente, 10 minutos e o modo como eu entrei no palco também foi uma alucinação, eu faço parte de um grupo de pesquisa e trabalho com surrealismo, e dos restos de uma exposição surrealista tinha um peito inflável, e eu já entrei no palco enchendo um peito inflável, lambi o peito e tal. E foi toda uma maluquice. Mas é diferente o modo como as pessoas reagem. Não sei pro Anderson quais são os momentos...

Anderson: Pra mim, o primeiro, por ter sido o primeiro e a gente não sabia o que ia acontecer, como ia, acho que o primeiro foi marcante. O terceiro, por conta da leitura do... Oswaldo Martins? Que tinha as imagens eróticas e tal, foi bom porque abriu pra gente a possibilidade de usar a imagem também como um suporte de leitura. O seguinte, o quarto ou o quinto, do telefone e tal, eu achei interessante porque a gente meio que relaxou também na apresentação, a gente criou um outro modo de apresentação com mais interação com o pessoal da plateia, interação também nossa, tipo, o cara está lá longe e liga, eu acho que ficou legal. Teve o de dezembro, foi o de dezembro?

Capilé: O de dezembro você não estava lá.

Anderson: Então, foi marcante porque eu não estava lá. Foi também bacana porque foi um que a gente fez sem o Pedro, foi seco, sem música, lendo todo mundo que já tinha lido, eu estava em Niterói, e toda hora alguém me ligando e dizendo "está ótimo!", então, eu acho que deve ter sido muito marcante e, sinceramente, o primeiro desse ano, porque a gente começou com o vídeo do Chicão, a gente começou com um trailer, teve a volta estava meio que aquele medo de "estamos voltando", lotado, a casa cheia, até agora nessas duas edições eu acho que o público está comparecendo mais, eu acho que tem mais gente, então o primeiro desse ano foi marcante, porque a gente voltou, teve esse sentido, e a gente conseguiu manter algumas coisas do antigo e conseguiu reformular também, e a reformulação foi legal. É isso aí.

Pamella: Eu ainda não fui a nenhum.

Anderson: Está dando mole!

Pamella: Mas, quinta-feira? Quinta-feira acaba comigo.

Larissa: Ele dá aula na sexta!


Pamella: Mas ele não fica aqui o dia inteiro na quinta-feira.

Anderson: Ah, é. Na quinta-feira eu vou pra casa e durmo.

(Áudio da leitura do Capilé:)

Capilé: Essa foi a minha leitura. Viram como o ambiente ficava barulhento aí o barulho volta, o barulho cai, o barulho volta, mas, assim, o som da leitura é esse. Tudo bem, eu decidi ler do início ao fim, uma leitura corrente. Então, o que vocês querem saber mais?

Pamella: Ah, acho que é isso, nós não fizemos perguntas pro papo fluir mesmo.

Larissa: Não ficar uma coisa jornalística.

Capilé: Mas, o problema é que a gente fala muito.

Pamella: Mas, isso é bom! Vocês são quem têm que falar.

Larissa: O ECO vai ser dia 04 mesmo, né?

Anderson: É, dia 04 de junho.

Capilé: O que está certo é que vai ter o lançamento do Encontrare, lançamento do folheto.


*

Pedimos perdão por eventuais erros de digitação. A madrugada não faz bem ao discernimento. E lembrando:



ECO - performances poéticas - 1 ano!
dia 4 de junho - 20:00 - Mezcla
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*Mezcla - Rua Benjamin Constant, 720, ao lado do MAM Murilo Mendes.

domingo, 17 de maio de 2009

"Vou fazer a arte do meu tempo"

impressões sobre a prosa brasileira contemporânea

É natural que para nós - que obviamente vivemos sob o signo da nossa contemporaneidade - apresentem-se dificuldades consideráveis nos impedindo de vislumbrar uma forma na literatura que está sendo produzida agora, nesse exato momento que escrevo essas linhas ou que vocês lêem essas palavras. E longe de mim pensar que nesse texto conseguirei distinguir e apontar essa unidade - se é que ela já existe ou existirá um dia - e nem é esse meu objetivo. Também não desejo empreender uma investigação acadêmica, nem organizar escritores contemporâneos, colocando-os como a livros em uma estante ou verbetes em uma enciclopédia. Minha motivação aqui é apenas registrar minhas impressões acerca das obras dos autores que vêm moldando a prosa brasileira, trabalho esse cuja forma final - se é que haverá algo a que poderemos chamar um dia de "forma - só poderá ser apreendida daqui um bom par de décadas. Ou mais.
Começo então pelo fim. Explico: o último livro que li foi Cordilheira (Companhia das Letras, 2008), de Daniel Galera. Eu já conhecia o trabalho do autor, havia lido Dentes guardados (Livros do Mal, 2001), seu primeiro livro, e o que me impressionou foi, além da fluidez da sua prosa, uma “surrealidade” um pouco próxima da que encontramos em alguns filmes de Almodóvar: tudo parece completamente estranho nos contos de Galera mas, a medida que nos aproximamos dos personagens e suas estórias, percebemos que aquilo poderia muito bem acontecer em qualquer lugar e com qualquer um. Sempre há uma possibilidade de realidade por trás do estranhamento e isso é uma qualidade literária que também aparece no romance mais recente de Daniel. Em Cordilheira, além da prosa fluida e dos acontecimentos estranhamente familiares, há outro ponto que chama bastante atenção: enquanto a produção artística contemporânea tem traçado um caminho de questionamento da realidade, trazendo- a para a ficção, Galera resolve fazer o contrário: seus personagens propõem a realização da ficção, em uma intrigante alegoria meta-narrativa.
Com outro nome bastante relevante da prosa atual, André Sant’Anna, tenho uma relação de amor e ódio. E André é assim mesmo: ame-o ou odeie-o e difame-o. E muita gente escolheu difamar, porque sua obra de fato desafia quem insiste em escrever a palavra “literatura” com ‘l’ maiúsculo. De onde vem minha birra com Sant’Anna? Das bobeiras que ele escreve de vez em quando - como o conto
“Nothing is real”, por exemplo -, da insistência em discutir com blogueiros que o criticam (jogue o nome do escritor no Google e veja algumas pelejas históricas), da atitude antipática de usar seu contrato com a Companhia das Letras como argumento irrefutável de que é um bom escritor. E meu amor por ele, de onde vem? De contos espetaculares como “É o caralho” e “A lei”, de sua petulância e coragem ao responder a revista Veja que, em uma crítica totalmente preconceituosa e conservadora, o esculachou completamente, da genialidade de O paraíso é bem bacana (Companhia das Letras, 2006). Soube esses dias que ele está lançando um livro novo, Inverdades (7letras, 2009) e, mesmo sem ainda ter lido, recomendo. Sempre vale a pena ler André Sant’Anna. E, depois da leitura, amá-lo profundamente, odiá-lo com todas as forças ou as duas coisas. Impossível é ficar indiferente à sua literatura.
Luiz Ruffato é quase uma unanimidade. Difícil encontrar alguém que não tenha ficado positivamente impressionado com a leitura de Eles eram muitos cavalos (Boitempo, 2001). Ruffato tem uma ótima receptividade não só pelo público, mas também – e talvez principalmente – pela crítica. São vários os artigos, trabalhos e dissertações sobre a obra do escritor mineiro. Ruffato parece mesmo ter encontrado a forma ideal de representação do nosso tempo: escrita fragmentada, acontecimentos simultâneos e tão intrincados quanto a própria realidade em que vivemos. Vale a pena ler também (os sobreviventes) (Boitempo, 2000), livro de contos que, de algum modo, já antecipa a reviravolta literária que o autor promoveria em 2001. Outra coisa interessante a respeito de Luiz Ruffato é sua visão de literatura como missão, fato que o leva a jamais negar um convite para falar sobre literatura, concordando inclusive em não cobrar nada por suas palestras (ao contrário da maioria dos escritores). E se um dia você tiver a oportunidade de ouvir Ruffato falar sobre o que quer que seja, não a deixe passar por nada. Ele é, de fato, genial.
Para terminar, Marcelino Freire, que já foi definido como o autor que “renova o desespero”. Narrativas curtas, ritmadas, espantosas. Não há quem não fique desconcertado com o conto
“Curso superior”, por exemplo, que assim como as outras narrativas de Contos negreiros (Record, 2005) toca direto nos problemas sociais do país, sem entretanto cair nos clichês já tão desgastados relativos a esse assunto. Marcelino extrapola os limites da literatura engajada, expondo as diferenças sócio-econômicas e as questões raciais por um viés cruel e impiedoso, já marcado na escolha da posição dos narradores, sempre em primeira pessoa. Uma experiência bastante interessante é assistir aos vídeos do próprio Marcelino lendo seus textos. Do conto "Totonha" já ficou uma frase antológica: "Eu que não vou abaixar minha cabeça pra escrever. Não vou."
Muitos outros autores que vêm aparecendo agora ou que já se firmaram como escritores representativos da nossa literatura poderiam estar também nesse texto – Tatiana Salem Levy, Milton Hatoum, Daniel Pellizzari, Joca Reiners Terron, Patrícia Melo, Cristovão Tezza, Bernardo Carvalho, Marçal Aquino, Lourenço Mutarelli, Marcelo Rubens Paiva e muitos, muitos outros – no entanto, o espaço é pequeno, o tempo curto e a vida, muito breve, não permite que consigamos escrever e ler tudo o que desejamos. Mas antes deixar gente de fora do que não ter matéria-prima para um texto como esse. Enquanto tivermos tantos bons autores, dignos de figurar como nomes importantes na prosa contemporânea, poderemos dizer aliviados que sim, a literatura brasileira vai muito bem, obrigado.

Obs: o título desse texto é uma frase do escritor carioca Sérgio Sant’Anna.

domingo, 3 de maio de 2009

I Colóquio Simone de Beauvoir

"Ninguém nasce mulher: torna-se mulher". A frase que abre o livro "Segundo Sexo" também foi usada para a abertura do I Colóquio Simone de Beauvoir, organizado pelo PPG de Ciências Sociais da UFJF e que ocorreu nessa semana.
Não somos estudantes do curso, mas o tema nos interessava muito, por isso fomos conferir e não nos arrependemos. Com o tema "Maternidades, paternidades, conjugalidades e política" o colóquio contava com autoridades nos assuntos e promoveu oficinas e mesas redondas.
Na abertura, discutiram os "Amores essenciais, amores contingentes" um assunto bastante polêmico, mas que fazia parte da vida de Simone de Beauvoir e Jean-Paul Sartre. As convidadas, Jovita Maria Gerheim Noronha (UFJF), Daniela Ribeiro Schneider (UFSC) e Clara Jaeger (Ato Freudiano), desenrolaram muito bem o tema, tocando na "ferida" que é um relacionamento aberto na época de Simone e Jean-Paul, um caso que ainda na atualidade gera grandes discussões. Destaque pessoal para Daniela Ribeiro, que foi fantástica!
No segundo dia do evento, o tema era a política nos vários segmentos sociais: Bruna, aluna do curso de Comunicação Social da UFJF e ativista do movimento Maria Maria, discursou sobre a participação da mulher, tarefa que desempenhou muito bem, principalmente tendo em vista a responsabilidade de falar logo após a ex-Reitora Margarida Salomão. A professora da Faculdade de Letras abordou os sindicatos e deu também um panorama sobre a atuação feminina na política universitária. Nada mais adequado, já que a professora foi Reitora por dois mandatos, a primeira mulher a ocupar o cargo e ainda a primeira a concorrer à Prefeitura de Juiz de Fora. O terceiro convidado, o professor Raul Magalhães, do curso de Ciências Sociais, abordou a política feminina de forma histórica: delineou a entrada da mulher no âmbito político, chegando a se utilizar da Comédia Velha, citando o texto "Assembleia de Mulheres", de Aristófanes.