quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Que poema você queria ter escrito?

Fizemos essa pergunta para três poetas. Confira as respostas.


"Beleza, refinamento e inteligência são apenas alguns dos atributos da série Três Epifanias Triviais, do livro Macau, de Paulo Henriques Britto, poemas que fazem parte da alvenaria do meu mundo. Levando em conta os modos retóricos que Ezra Pound utilizou para definir a linguagem poética: o som, a imagem e a idéia, vemos que Paulo Henriques Britto maneja habilmente o enlaçe entre os três planos. A banalidade de um lance visual, como uma xícara quebrada, as louças de Pompéia ou a abertura de um pote de pessegos em calda, contribui com o sofisticado jogo de linguagem e pensamento que está pulsando nas entrelinhas. Não que isso tenha a mínima importância."

Lucas Viriato é poeta - publicou Memórias indianas (Ibis Libris, 2007), Retorno ao Oriente (7Letras, 2008) e Contos de Mary Blaigdfield, a mulher que não queria falar sobre o Kentucky - e outras histórias (7Letras, 2010) - e editor do jornal Plástico Bolha.

[Este é apenas um dos textos da série escolhida pelo Lucas, que conta ainda com mais dois poemas]


"Eu queria ter escrito “Caso pluvioso”, do Drummond. Não é, obviamente, o maior poema dele, mas reúne quase tudo do que considero um bom poema. Primeiro, tem um ritmo e uma sonoridade pra lá de fluidos, que disfarçam e quebram a dureza dos decassílabos. Tem um conteúdo narrativo que em nenhum momento vira narração pura (por conta da questão anterior). Tem uma linguagem altamente criativa (todo aquele leque léxico de palavras derivadas de ‘chuva’), com umas inversões sintáticas elegantes. Além disso, é escrito em dísticos, que é um troço dificílimo de se fazer."


Diego Grando é poeta, autor de Desencantado carrossel (Não Editora, 2008) e Palavra Paris (Não Editora, 2011)






“Eu poderia escolher uma infinidade de bons poetas, como Drummond ou Bandeira. Mas a minha relação com o Augusto dos Anjos vai além do texto... A minha adolescência não foi diferente de nenhuma outra, sofri bastante, como todos. Entretanto eu gostava de poesia, meus amigos não. Encontrei nos versos de Augusto dos Anjos inspiração e compreensão. Naquela época, há 10 anos, eu achava que poesia era, somente, se encontrar nas palavras de outrem. Além disso, eu me senti muito feliz, de com 12, 13 anos, “descobrir” um poeta e não simplesmente estudá-lo nas aulas de literatura. Escolhi esse por conta do verso mais me marcou naquela época: “Ser homem! Escapar de ser aborto!”. Era muito difícil explicar porque eu gostava tanto, pois todos se baseavam pelo lado raso da significação. Depois de Augusto dos Anjos conheci muitas coisas, mas  sem dúvida minha admiração continua.”

Anelise Freitas é poeta e seu primeiro livro, Vaca contemplativa em terreno baldio, sai mês que vem. Enquanto isso ela mantém o blog com o mesmo nome.



[Esse é apenas o primeiro trecho do poema escolhido pela Anelise, que pode ser lido na íntegra aqui]

4 comentários:

  1. fazendo as honras da casa (e torcendo pras pessoas perderem a vergonha de comentar ao ver que já tem um comentário), eu queria ter escrito "a carlos drummond de andrade", do joão cabral. ainda tatuo alguns desses versos.

    Não há guarda-chuva
    contra o poema
    subindo de regiões onde tudo é surpresa
    como uma flor mesmo num canteiro.

    Não há guarda-chuva
    contra o amor
    que mastiga e cospe como qualquer boca,
    que tritura como um desastre.

    Não há guarda-chuva
    contra o tédio:
    o tédio das quatro paredes, das quatro
    estações, dos quatro pontos cardeais.

    Não há guarda-chuva
    contra o mundo
    cada dia devorado nos jornais
    sob as espécies de papel e tinta.

    Não há guarda-chuva
    contra o tempo,
    rio fluindo sob a casa, correnteza
    carregando os dias, os cabelos.

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  2. Bom, assim como a Anelise, Augusto dos Anjos marcou muito minha adolescência, acho que ele foi meu passaporte de entrada pra poesia em geral. Acho que esse é até um pouco clichê mas tenho uma ligação forte com ele e gostaria que fosse meu. Melhor (já que ele é meu, de alguma forma): gostaria que ele tivesse sido de minha autoria.

    VERSOS ÍNTIMOS
    Vês! Ninguém assistiu ao formidável
    Enterro de tua última quimera.
    Somente a Ingratidão - esta pantera -
    Foi tua companheira inseparável!

    Acostuma-te à lama que te espera!
    O Homem, que, nesta terra miserável,
    Mora, entre feras, sente inevitável
    Necessidade de também ser fera.

    Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
    O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
    A mão que afaga é a mesma que apedreja.

    Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
    Apedreja essa mão vil que te afaga,
    Escarra nessa boca que te beija!

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  3. Eu também gostaria de ter escrito o liro "Alguma Poesia", do Drummond. Esse livro é tão bom que é foda de escolher apenas um poema.

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  4. Eu queria ter escrito:

    "Soneto de Fidelidade" (Vinícius de Moraes)

    De tudo ao meu amor serei atento
    Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
    Que mesmo em face do maior encanto
    Dele se encante mais meu pensamento.

    Quero vivê-lo em cada vão momento
    E em seu louvor hei de espalhar meu canto
    E rir meu riso e derramar meu pranto
    Ao seu pesar ou seu contentamento

    E assim, quando mais tarde me procure
    Quem sabe a morte, angústia de quem vive
    Quem sabe a solidão, fim de quem ama

    Eu possa me dizer do amor (que tive):
    Que não seja imortal, posto que é chama
    Mas que seja infinito enquanto dure.

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