sexta-feira, 18 de junho de 2010

No dia seguinte ninguém morreu

Todos sabemos que cada dia que nasce é o
primeiro para uns e será o último para outros
e que, para a maioria, é so um dia mais.
José Saramago (1922 - 2010)


A primeira vez que peguei num livro dele foi há aproximadamente 3 anos. Depois de esperar séculos na fila da Biblioteca Universitária, meu irmão finalmente conseguiu acesso à tão procurada obra. Em cima do móvel de madeira, o livro esperava por ser lido. Já ouvira falar tanto sobre ele, que o abri com certo receio. Histórias de terapia e dificuldade para enxergar após sua leitura perpassaram minha mente enquanto eu lia, sem fôlego, aos primeiros parágrafos. O ritmo incessante me arrastava e meu coração saltou quando li a primeira fala, Estou cego. Demorei mais de um ano até ter acesso ao livro novamente, mas quando o tive em minhas mãos, devorei-o. Foi como um paraíso distorcido. Confortável, aprazível, ele não era. O gostoso era ver a boa literatura, só isso. Não importava a angústia, o nervosismo e a revolta ao fim de cada capítulo; só importava o fato de ter em minhas mãos um exemplar da perfeição. Alguns outros vieram depois, e então conheci um homem à procura de um barco, uma península que rachava, a greve da morte, um Jesus diferente. Mas os cegos nunca me deixaram, nem creio que um dia o farão. O senhor mudou a minha vida, Sr. Saramago, e eu lhe agradeço por isso.

*

Texto originalmente publicado no blog cahier, em 27/03/2009: http://bit.ly/d29kHI

3 comentários:

  1. “Hoje é hoje, amanhã será amanhã, é hoje que tenho a responsabilidade, não amanhã, se estiver cega, Responsabilidade de quê, A responsabilidade de ter olhos quando os outros os pederam.”

    Que dia mais triste. =/

    ResponderExcluir
  2. A gente sempre sabe que a morte é um fato e, mais cedo ou mais tarde, vai acontecer, mas não há formas de ficar preparado esperando por ela. Ela chegou, infelizmente. Tenho com ele aquela relação de fã-distante, mas sinto o mundo mais triste hoje. E mais pobre também =/.

    ResponderExcluir
  3. Eu não me lembro da primeira vez que o encontrei. Lembro-me de que li A jangada de pedra durante um carnaval que abandonei apesar de estar no Rio de Janeiro. A revista Ipotesi do PPg em letras da UFJF vai editar o próximo número todo dedicado a ele, uma justa homenagem. Eu e Luiza Scher vamos coordenar. É isso, tudo emociona

    ResponderExcluir